Apresentação

Esta obra coletiva reúne a contribuição de pesquisadores e pesquisadoras de diversos campos, todos/as mobilizados/as para subsidiar a construção de uma denúncia de violação de direitos humanos no Brasil durante a pandemia de Covid-19. É coordenada pela Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil (AMDH), que reúne o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), o Processo de Articulação e Diálogo Internacional (PAD) e o Fórum Ecumênico Act Brasil (FeAct), em conjunto com o Fórum Nacional de Defesa do Direito Humano à Saúde. A realização contou com a cooperação da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

A iniciativa tem acolhida e parceria em dois órgãos institucionais: o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), espaços de participação popular e de controles social das políticas, mas também encarregados de promover ações para que situações de ameaça ou de violação dos direitos humanos encontrem as devidas responsabilizações.

A iniciativa se orienta pela responsabilidade das organizações da sociedade civil que atuam em direitos humanos no Brasil, pois entendem que lhes cabem a vigilância das situações, a documentação e a denúncia pública das violações de direitos humanos, para buscar seu processamento pelos órgãos encarregados de monitoramento do cumprimento dos compromissos nacionais e internacionais de direitos humanos. No centro, a pretensão de sustentar a denúncia de que o Estado brasileiro e o governo Bolsonaro, por ação e omissão, violaram os direitos humanos no modo como realizaram o enfrentamento da pandemia de Covid-19, particularmente o direito à vida e o direito à saúde – ambos previstos nos pactos internacionais dos quais o Estado brasileiro é signatário, e também previstos expressamente na Constituição Federal.

Os documentos aqui apresentados servem de subsídio para o Denúncia de violações dos direitos à vida e à saúde no contexto da pandemia da Covid-19 no Brasil1, que, por sua vez, ser orientou a subsidiar pedidos de responsabilização junto a organismos internacionais de direitos humanos e às instituições nacionais. Mostra que a Covid-19 se apresenta como um acontecimento que trouxe impactos significativos na vida do conjunto das populações. Mas esse impacto não foi igual para todos/as, visto que aqueles e aquelas que já estavam em condições precarizadas de vida as viram ficar ainda piores. Também mostra que ações implementadas e omissões havidas por parte do governo Bolsonaro contribuíram para tornar ainda pior o impacto e resultaram em mortes massivas, as quais, segundo diversos estudos, ainda que estes divirjam nos números, mostram que milhares de vidas poderiam e deveriam ter sido evitadas:se uma única vida pudesse ter sido evitada, já teria sido altamente relevante.

A responsabilidade pelas diversas violações é analisada nos dez artigos que compõem a coletânea à luz das normativas internacionais e nacionais de direitos humanos. Os artigos de Pedro Hallal e Maria dos Remédios demonstram as “mortes evitáveis” e como elas ficaram distribuídas no território, dando bases consistentes para afirmar que, de cada cinco, quatro mortes poderiam/deveriam ter sido evitadas. Armando de Negri analisa as situações e, sobretudo, aponta perspectivas e possibilidades para a promoção da justiça testemunhal às vítimas, indicando a necessidade de identificar quem foi beneficiado pelas violações dos direitos humanos. Elda Bussinger se ocupa de questões de bioética e demonstra como várias das previsões normatizadas foram redondamente violadas, sobretudo em experimentos desautorizados e ineficazes. Euzamara de Carvalho demonstra como as normativas internacionais de vigilância sanitária foram descumpridas ou negligenciadas no enfrentamento da pandemia. Bruno Moretti faz uma  consistente análise do modo como o financiamento (ou o desfinanciamento) da saúde contribuiu para agravar a pandemia. Cristian Gamba mostra o impacto da pandemia entre encarcerados/as. Soraia Mendes trata desse impacto para as mulheres e advoga ter havido um “feminicídio de Estado”. Benilda Brito demonstra como negros/as e quilombolas foram afetados dramaticamente pela pandemia. Eloy Terena traz as demonstrações da existência de práticas de genocídio da população indígena no modo como o Governo agiu e também em razão do que deixou de fazer para proteger os/as indígenas.

São apresentados e demonstrados aspectos estruturais da desassistência e da prática necropolítica patrocinada pelo governo Bolsonaro, que levaram à violação dos direitos humanos à vida e à saúde do povo brasileiro, mas também é particularmente demonstrado como esses aspectos impactaram aqueles segmentos sociais mais afetados. As violações de direitos humanos afetam diretamente sujeitos/as de direitos que, por não terem garantidos os direitos humanos, são convertidos/as em vítimas de violação.

Este material, junto com o Documento de Denúncia, servirá de base para iniciativas de responsabilização pelas violações de direitos humanos. Por esta razão é que será apresentado em seu todo, ou em partes específicas, aos organismos do Sistema Global e do Sistema Regional de Proteção dos Direitos Humanos. Também, será entregue aos órgãos públicos do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal para subsidiar iniciativas da competência de cada um.

É inaceitável que vidas humanas, num contexto tão impactante como foi o da Covid-19, tenham sido maltratadas e perdidas, tenham sido violentadas e violadas em seus direitos por quem deveria, por responsabilidade constitucional e em razão dos compromissos internacionais do Estado brasileiro em matéria de direitos humanos, ter sido agente de seu cuidado, promoção e proteção.

As organizações e os/as pesquisadores/as que construíram esta obra se colocam ao lado das vítimas da pandemia que, por falta do necessário cuidado de seus direitos, morreram ou ficaram com graves sequelas. Somam-se também ao esforço de construção da verdade, da justiça e da necessária reparação. Há que se  responsabilizar os agentes das violações, mas também é necessário trazer à luz aqueles/as que se beneficiaram das violações, as vítimas que as sofreram e seguem sofrendo-as.

Finalmente, as organizações promotoras agradecem aos/às pesquisadores/as que construíram estes subsídios, demonstrações e argumentos. Agradecem, também, às diversas organizações parceiras que se aliançaram para a construção deste documento; particularmente, ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), pela confiança e viabilização do apoio necessário à sua realização, e ao Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), que se somou nesta parceria.

Brasília, outubro de 2021.

Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil (AMDH)
Fórum Nacional de Defesa do Direito Humano à Saúde
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
Processo de Articulação e Diálogo Internacional (PAD)
Fórum Ecumênico Act Brasil (FeACT)
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH)
Centro de Educação e Assessoramento Popular (CEAP)

BRANCO, M. R. F. C.. Excesso de mortes no Brasil durante a pandemia de Covid-19. In: Paulo César Carbonari; Nara Aparecida Peruzzo; Enéias da Rosa. (Org.). Violações dos direitos humanos no Brasil: denúncias e análises no contexto da Covid-19. 1ed.Passo Fundo, RS: Editora Acadêmica do Brasil – EAB Editora, 2021, v. , p. 23-33.

Publicação

Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH). Violações dos direitos humanos no Brasil : denúncias e análises no contexto da Covid-19 [recurso eletrônico] / Sociedade Maranhense de Direitos Humanos … [et al.]. – Passo Fundo: Saluz, 2021. 227 p. ; 9,3 MB ; PDF. ISBN: 978-85-69343-72-1. DOI: 10.5281/zenodo.5643632

Palavras-chave

  • Saúde pública.
  • Pandemia de Covid-19.
  • Direitos humanos.
  • Violação de direitos.

Organização

  • Paulo César Carbonari
  • Nara Aparecida Peruzzo
  • Enéias da Rosa

Autores

  • Armando Antônio de Negri Filho
  • Benilda Regina Paiva de Brito
  • Bruno Moretti
  • Cristian de Oliveira Gamba
  • Elda Coelho Bussinguer
  • Euzamara de Carvalho
  • Luiz Eloy Terena
  • Maria dos Remédios F. Carvalho Branco
  • Pedro Rodrigues C. Hallal
  • Soraia da Rosa Mendes